quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Cerco na Cidade

Lady e eu andávamos vagorasamente pelas ruas que um dia chamamos de casa. Ela estava agarrada em meu braço e com sua cabeça levemente apoiada em meu ombro. Fazia frio e a chuva havia caído o dia inteiro.

Era uma noite fria, de ruas molhadas, de esperanças retidas e sonhos inacabados. Era uma noite perfeita para um passeio.

Andávamos através das ruas iluminadas, havia mais pessoas andando. A cidade nunca parava. Avistamos restaurantes vinte e quatro horas, prostitutas oferecendo amores internacionais, vendedores que se faziam incansáveis, teatros ainda abertos e uma multidão.

Uma multidão? Um espetáculo. O circo estava na cidade. Abrimos espaço por entre a multidão.

Era uma roda que se fechava. No meio estavam os palhaços, faziam malabares com frutas, com pinos, com objetos, com armas. Ao redor estavam os palhaços mais sérios. "Palhaço sério?" Apontavam seus malabares para os outros palhaços. Entretiam a plateia de formas que os restaurantes, as prostitutas, os vendedores e os teatros não podiam. Os agarravam pela curiosidade, pela excentricidade, pelo fora do comum. Pela expectativa de que alguma coisa aconteceria.

Pacata pacaticidade, pacata cidade. Vivíamos a nossa vida como todos a vivem, na vã esperança de que algo acontecesse. De que o estranho inusitado nos atirasse uma escada pra que saíssemos do buraco em que havíamos nos metido quando nascemos. E por isso se montavam os espetáculos. O circo estava na cidade. O circo sempre anima nossas vidas.

A situação se resolveu, agora os palhaços estavam aos pares, cada sério com um outro não-sério. Se dirigiam às diligências e assim deixariam-nos mais uma vez a vagar pelo mundo, um dia seremos entretidos desse jeito, desse mesmo jeito talvez.

"Ainda bem que acabou bem, não?" Não, o circo não devia acabar assim. O circo sequer devia acabar. Pra sempre deveria encantar nossas vidas de formas que não imaginássemos, pra sempre deveria estar ali por nós, nos apoiando sempre.

"Nada mais pra ver aqui!" Sim, senhor. Vamos pra casa então.

Dia incomum. Lady segurou meu braço mais forte e voltamos pra casa.