terça-feira, 30 de novembro de 2010

Cavalo Branco

- Já faz alguns anos que não ouço falar dos Galeazzo.

De fato. Voltaram a serem mencionados agora, há pouco tempo. Costumava ser uma Família grande mas era necessário que ela saísse do caminho, entende? Garçonete? Garçonete! Traz mais um xícara de café, por favor?

- Pra mim também, por gentileza.

Enfim, o que eu estava dizendo... ah, lembrei, lembrei. O que aconteceu com os Valenzzetti's foi realmente uma infelicidade... e um aviso. Digo, como é possível uma única pessoa fazer aquilo? Nós ouvimos histórias nesse ramo, é verdade, mas nunca ouvi nada igual. Algo está a solta. Nem na época de ouro das famílias, há uns 60, ou 70 anos atrás. Ah, o café! Obrigado, garçonete. Açúcar, tem?

- Também gostaria.

Infortúnios, Carlo, infortúnios. Em pensar que a única prova que ligava coisa com coisa naquela casa foi deixada pelo homem que cometou aquele massacre. "Galeazzo's voltaram". Pode acreditar nisso?

- Eu não sabia que havia sobrado alguém pra sequer lembrar esse sobrenome, senhor.

Cá entre nós, existe uma pessoa sim. Lembra-se daquele dia, há uns 20 anos atrás? Você era nascido naquela época? Era, não? Enfim...

---

A casa de bonecas ocupava boa parte do quarto. Era uma representação em miniatura da casa onde moravam. Lá estava Agatha-Boneca, Papai-Boneco e Mamãe-Boneca. As outras pessoas que moravam junto eram bonequinhos improvisados. Agatha era a Rainha-da-Casa-de-Bonecas. Naquela casa, podia haver final feliz todo o dia.

Conquistadora do mundo de 10 centímetros, era Agatha.

Naquela noite, o mundo que não era de Agatha não veria um final feliz.

Tumulto na casa. Barulhos altos, ensurdecedores para Agatha. Mamãe entra no quarto, desesperada, chorando. "Esconda-se debaixo da cama, filha, esconda-se!"

E o tempo passa. 5 minutos se alonga a algumas eternidades. Mamãe, que havia saído do quarto, volta. Tenta não fazer barulho. Vai tirar ela de lá! Vamos, Mamãe, vamos!

Homem alto pára na frente da porta, Mamãe se vira antes que Agatha possa sair debaixo da cama.

Agatha fecha os olhos. Escuro. Barulhos estridentes, disparos, gritos. Corpo que cai sobre a casa de bonecas. Agatha abre os olhos, chorando, mas consegue ver o homem que atirou em sua mãe. Ele a poupa. Ela não.

Por que o mundo não pode ser como Agatha quer? Por que não podia ser como na casa de bonecas que todo dia tinha final feliz? O mundo devia ter. Para Agatha, sim. Ser a conquistadora do mundo de 10 centímetros não mudava o mundo lá fora.

---

Essa é a história. Até onde eu saiba, única alma viva a sair daquela casa, naquele dia. É duro pra uma criança, mas a vida é dura.

- Que triste. Mas acho que faz parte do trabalho, certo?

Certo. Vamos encontrar o rato que fez aquilo com os Valenzzetti's, lhe garanto. Bebemos o café agora, vai esfriar.

- Chefe, curiosidade. Era você o cara da história?

Hehe... coração mole todo mundo tem, Carlo. Mas nesse ramo não se pode deixar mostrar.

- ...

Carlo? Garçonete?

- No fim das contas, senhor, todo mundo ganha o que pede, de certa forma. Você pediu café e teve. Flertara tantas vezes com a morte que finalmente a encontrou. Todo mundo se arrepende, ao meu ver. A vida não passa de uma grande casa de bonecas. Eu diminui a concentração no seu café para que todas as etapas do envenenamento possam ser vividas. Esperei muito tempo por isso. No fim das contas, nada passa de uma grande casa de bonecas. Todos somos manipulados e postos de lado no fim do dia. A diferença é que eu quero ser a que manipula. Mas não me entenda mal. Eu só quero dar um final feliz pra todo mundo. Afinal, os Galeazzo's voltaram.

Nenhum comentário:

Postar um comentário